terça-feira, 14 de julho de 2015

ANIVERSÁRIO DE 25 ANOS DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

ANIVERSÁRIO DE 25 ANOS DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Nesse próximo dia 13 de julho, a Lei Federal 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente)
completará 25 anos de existência. Temos o que comemorar?

Como se sabe, o Estatuto da Criança e do Adolescente reconheceu que o público infanto-juvenil
merecia tratamento mais digno do que o oferecido pelo revogado Código de Menores, passando os
infantos a serem tratados como sujeitos de todos os direitos  fundamentais inerentes à pessoa
humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por
outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico,
mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

DO CONSELHO TUTELAR
Ao longo desse período de 25 anos, por meio de ações e termos de ajuste de conduta, o Ministério
Público Brasileiro conseguiu a implantação dos Conselhos Tutelares em quase 100% dos
municípios brasileiros, melhorar a infraestrutura dos prédios onde funcionam tais órgãos, veículos e
equipamentos de trabalho. Em outubro desse ano deverão ocorrer as primeiras eleições nacionais
unificadas para o cargo de conselheiro tutelar, data em que será possível à população identificar
com mais clareza as atribuições desse órgão, através das campanhas individuais dos candidatos e da
propaganda oficial que a Secretaria de Direitos Humanos/PR promete fazer em âmbito nacional.
Por meio da Lei 12.696/12 os conselheiros passaram a ter seus direitos previdenciários,
remuneratórios, entre outros reconhecidos. Foi fixado o mandato de 4 anos, além da obrigação dos
municípios de garantirem o pleno funcionamento dos Conselhos Tutelares por meio de verbas
específicas a serem previstas na Lei Orçamentária.

DO DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA
De outra banda, no ano de 2009, com o advento da Lei 12.010, o direito à convivência familiar e
comunitária foi ampliado, sendo fixado que aintervenção estatal, em observância ao disposto no
art. 226 da Constituição Federal, será prioritariamente voltada à orientação, apoio e promoção social
da família natural, junto à qual a criança e o adolescente devem permanecer, ressalvada absoluta
impossibilidade, demonstrada por decisão judicial fundamentada. Na impossibilidade de
permanência na família natural, a criança e o adolescente serão colocados sob adoção, tutela ou
guarda, observadas as regras e princípios contidos na Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990.
Com essa orientação legal, cabe aos Hospitais e Maternidades garantirem às gestantes o
atendimento psicológico, nas hipóteses em que manifestarem a intenção de entregar o bebê em
adoção. As equipes técnicas das Maternidades já estão treinadas para acionarem o Conselho Tutelar
sempre que essas gestantes insistirem no ato de entrega dos bebês, ocasião em que pode ocorrer o
acolhimento dessas crianças nas entidades de atendimento.
Como forma de cruzar as informações entre as pessoas que querem adotar e as crianças que estão
disponíveis para adoção, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) desenvolveu o Cadastro Nacional
de Adoção (CNA), que passou recentemente por ajustes técnicos. Conforme definido em Lei, a
regra passou a ser a plena obediência à ordem de chegada no Cadastro, sendo plena exceção a
adoção feita por pessoa sem cadastro.

DO SISTEMA NACIONAL DE ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO -SINASE - E DA
REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL
Quanto às medidas socioeducativas, aplicadas contra os adolescentes que praticam atos infracionais,
finalmente foi promulgado o SINASE, Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, por meio
da Lei 12.594/12, sendo definidas as responsabilidades dos Estados pela execução das medidas em
meio fechado (internação e semiliberdade) e dos Municípios, pelas medidas em meio aberto
(prestação de serviços à comunidade e liberdade assistida). Um importante avanço trazido por essa
Lei foi a obrigatoriedade de construção dos Planos de Atendimento Socioeducativo (pela União,
Estados e Municípios), por meio do qual se faz o diagnóstico da violência e são fixadas as diretrizes
de atendimento, metas, prazos e as formas de financiamento e gestão das ações de atendimento para
os 10 (dez) anos seguintes, com previsão de reavaliação a cada três anos.

Destaque-se o quanto ainda é recente essa Lei Federal que definiu a execução das medidas
socioeducativas (2012), em especial se comparado com a Lei de Execução Penal, que é de 1984. É
possível afirmar que o Congresso Nacional está discutindo a redução da maioridade penal sem antes
ter dado sequer a chance do SINASE ser adequadamente implantado e executado. Diversos são os
argumentos contra e a favor da redução, mas um fato é inquestionável: o sistema de execução penal
é muito mais antigo e já deu sinais claros de que não é mais eficiente do que o sistema
socioeducativo (muito pelo contrário). As estatísticas nos informam que o índice de reincidência no
sistema penal é de cerca de 70% e no socioeducativo é de apenas 20%.

Os parlamentares que defendem a redução dizem que na presente época os jovens são muito mais
informados do que antigamente e por isso possuem consciência do certo e errado. O contraponto a
ser feito passa pelo reconhecimento de que na década de 1960, 1970, um número imenso de
adolescentes já era pai, arrimo de família, trabalhava e tinha muitas responsabilidades que hoje os
jovens desconhecem.

Em relação ao argumento de que a pessoa que vota também deve ser responsável criminalmente,
dizemos, em primeiro lugar, que o voto para menores de 18 anos é facultativo, e, em segundo lugar,
que essa opção legislativa de facultar o voto aos jovens talvez tenha sido proposital, como forma de
captar o voto das pessoas menos esclarecidas politicamente.

Muito se comenta acerca da idade de responsabilização penal em outros países, afirmando que no
Brasil a idade de 18 anos é exagerada. No entanto, as pesquisas realizadas demonstraram a
diferença entre idade penal e idade de responsabilidade penal. Naquela, a pessoa é considerada
maior para todos os efeitos, sendo punida da mesma forma que um adulto. Nesta, a pessoa é
considerada capaz de responder por seus atos, mas de maneira  diferenciada e específica para os
jovens. Sendo assim, é preciso deixar claro que no Brasil a idade de responsabilidade penal foi
fixada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente em 12 anos de idade, dentro da média mundial.

Outro ponto importante a ser esclarecido é com relação ao tempo de internação. Muitos reclamam
que o prazo máximo de privação de liberdade de 3 anos é insuficiente. Para esses afirmo que, na
imensa maioria dos casos (99%), esse prazo é compatível com o tempo de prisão enfrentada por
uma adulto, quando descontados os benefícios legais, tais como a progressão e o livramento
condicional. Podemos citar um exemplo: num crime de roubo praticado por um adolescente, em co-autoria com um maior, este deve ser sentenciado a uma pena média de 6 anos de reclusão, enquanto
ao adolescente é aplicada a internação pelo prazo máximo de 3 anos. Como se sabe, às penas entre 4
e 8 anos de reclusão, o regime de pena a ser aplicado é o semiaberto e não o fechado. Ou seja,
enquanto o adolescente está internado (privado de liberdade), o adulto pode iniciar sua pena no
semiaberto (se existir esse equipamento público). Esse mesmo adulto progride de pena após o
transcurso de 1/6 da pena, ou seja, em apenas 1 ano ele deixa o semiaberto e passa a cumprir sua
pena no regime aberto.

Reconhecemos, de outra banda, que para os atos infracionais extremamente graves, como homicídio
qualificado, estupro, latrocínio, entre outros, o período de privação de liberdade poderia ser
ampliado, para manter a proporcionalidade às penas aplicadas contra os maiores. Essa tese já está
sendo defendida por alguns parlamentares e pelo Fórum dos Promotores da Infância e Juventude –
PROINFANCIA, através de Projetos de Leis em tramitação.

Essa ampliação no período de privação de liberdade não demandaria nenhuma modificação na
Constituição Federal, bastando a alteração do Estatuto da Criança e do Adolescente, certo de que a
resistência a ser enfrentada seria muito menor, sobrando mais tempo para a votação de tantos outros
Projetos de Leis tendentes a garantir políticas públicas de qualidade para evitar o aumento da
criminalidade.

Entre tantos avanços obtidos nesses 25 anos da Lei 8.069/90, a redução da maioridade penal seria
um imenso retrocesso social (o que é vedado em nosso ordenamento), já reconhecido por outros
países que também reduziram e que agora caminham no sentido inverso.

Sidney Fiori Junior, Promotor de Justiça em Araguaína/TO, Coordenador do Centro de Apoio
Operacional da Criança e do Adolescente